3vezes3: O lado sombrio da lua. Aquela que cria & Aquele que dança. Este Blog é uma expressão dos pensamentos mágicos perdidos na névoa virtual.

sábado, 28 de agosto de 2010

Mitologia Grega - Deuses do Olimpo

Mitologia Grega:

Os Deuses do Olimpo


Iremos dar início a um estudo sobre os Deuses das religiões humanas. A saber uma fonte de abordagem básica, clara e consinta. O estudo aborda temas específicos sem conexão cronológica de acontecimentos. Em primeiro momento trataremos sobre os Deuses Olímpicos, em outros momentos Titânicos, deuses menos abordados e semi-deuses.

A abordagem será apresentada de forma docente, contudo que compreenda a prática dos cultos modernos destes Deuses.



Olimpo, afresco, c.1850.
Luigi Sabatelli


Os Doze Deuses Olímpicos, também conhecidos como o dodekatheon, que é composto por dōdeka, "doze"+ θεοί, theoi, "deuses").


A primeira referência antiga a cerimónias religiosas em sua honra encontra-se no Hino homérico dedicado a Hermes. A composição clássica dos Doze Deuses Olímpicos (o Doze Canónico da arte e da poesia) inclui os seguintes deuses: Zeus, Hera, Poseidon, Atena, Ares, Deméter, Apolo, Ártemis, Hefesto, Afrodite, Hermes e Dioniso. Os doze deuses romanos correspondentes eram Júpiter, Juno, Neptuno, Minerva, Marte, Ceres, Apolo, Diana, Vulcano, Vênus, Mercúrio e Baco.[1] Hades (no panteão romano, Plutão) não era geralmente incluído nesta lista. Não tinha assento no panteão porque passava a maior parte do seu tempo nos Infernos. Também costuma aparecer entre os doze Héstia (entre os romanos, Vesta.) Quando foi dado lugar a Dioniso, o número total de Olímpicos passou a ser treze. Sendo tal número indesejável, e de modo a evitar conflitos, Héstia abdicou do seu lugar entre os doze.

A composição do grupo dos Doze Olímpicos, contudo, varia substancialmente entre os autores da antiguidade. Heinrich Wilhelm Stoll considera, mesmo, que a limitação ao número de doze é uma ideia relativamente moderna[2] Cerca de 400 a.C., Heródoto incluía na sua composição do Dodekatheon as seguintes divindades: Zeus, Hera, Posídon, Hermes, Atena, Apolo, Alfeu, Cronos, Reia e as Cárites.[3] Wilamowitz concorda com a versão de Heródoto.[4]

Os deuses olímpicos moravam em um imenso palácio, em algumas versões de cristais, construído no topo do monte Olimpo, uma montanha que ultrapassaria o céu. Alimentavam-se de ambrósia e bebiam néctar, alimentos exclusivamente divinos, ao som da lira de Apolo, do canto das Musas e da dança das Cárites. Apesar de nunca haver se acabado por completo, e tendo permanecido oculto na maior parte da Grécia devido à perseguição político-religiosa que sofreu, o culto dos deuses olímpicos tem sido restaurado de forma mais explícita na Grécia desde os anos 90, através do movimento religioso conhecido comoDodecateísmo e no restante do Mundo com o Reconstrucionismo Helênico.

A frente estaremos analisando os 12 Deuses Olímpicos:

  • Zeus
  • Hera
  • Poseidon
  • Atena
  • Ares
  • Deméter
  • Apolo
  • Ártemis
  • Hefesto
  • Afrodite
  • Hermes
  • Dioniso



__________________
Fonte:
1.           "Greek mythology". Encyclopedia Americana 13. (1993). 
* "Dodekatheon". (em Greek) Papyros-Larousse-Britanicca. (2007).

2.           STOLL, Heinrich Wilhelm. Handbook of the religion and mythology of the Greeks (em Inglês)Londres: Francis and John Rivington, 1852. pp.8. ISBN
3.           a b "Dodekatheon". (em Greek) Papyros-Larousse-Britanicca. (2007).
4.           Wilamowitz-Moellendorff, Ulrich von. Der Glaube der Hellenen (Volume 1) (em Alemão).  Berlin: Weidmansche Buchhandlung, 1931–1932. pp.329.


segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Sexismo emburrece e mata - Conceição Oliveira



Sexismo emburrece e mata

Fonte: http://www.viomundo .com.br/blog- da-mulher/ sexismo-emburrec e-e-mata. html (em 26/07/2010 ev)


Por: Conceição Oliveira, no twitter: @maria_fro
Show de horrores
Há três semanas tento digerir um verdadeiro show de horrores noticiado. Os detalhes sórdidos de mais um feminicídio anunciado, o de Eliza Samúdio, tomou a mídia grande, a blogosfera e até os sites pornôs. O principal suspeito é Bruno, ex-goleiro do Flamengo e possível pai do filho da vítima, que ao que tudo indica foi seqüestrada, torturada, morta e teve partes de seu corpo dadas aos cães. A barbárie se esmerou nos textos jornalísticos e nos comentários que voltaremos a discutir ao longo deste longo texto. Tomem fôlego.
Houve também o caso de estupro de uma adolescente, praticado por mais três adolescentes em Santa Catarina. O crime primeiramente foi denunciado por um blog local, o Tijoladas, e com bastante atraso chegou à grande mídia. O estupro ocorreu na casa de um dos adolescentes agressores que é membro da família de um dos principais donos da RBS (a maior empresa de mídia do Sul do país). O outro é filho de um delegado. Segundo relatos no referido blog, com requintes exibicionistas um dos adolescentes estupradores postou em redes sociais mensagens informando que estuprou a menina. Ao ser questionado se não tinha medo de ser punido, respondeu com desdém: ‘Tá de zoeira?’.
Nesse caso, que chegou a TV Record por Paulo Henrique Amorim, que se comprometeu a acompanhar de perto o desenrolar do processo,  tivemos o desprazer de ouvir mais um depoimento cínico. No Domingo Espetacular, o delegado da polícia civil que investigava o caso disse que – em relação à adolescente que teve até um controle remoto introduzido em sua vagina – é possível afirmar que houve ‘relação carnal’, mas que não poderia falar em estupro na medida em que ele não estava presente. O delegado ainda insinua que o estupro de uma menina de 13 anos, realizado por três adolescentes violentos e protegidos pelos pais, teria sido na verdade uma relação sexual de comum acordo entre a vítima e os agressores.
Segundo relatos, a mãe do garoto da RBS, após saber o que tinha acontecido, maquiou as escoriações do pescoço da garota (que estava sob efeitos de álcool e possivelmente outras drogas), ligou para os pais da menina para que viessem buscá-la e deu a entender que ela estava em uma ‘festinha’. O comentário do delegado catarinense é da mesma categoria do de Demóstenes Torres (DEM) que, na luta contra as cotas no Senado, afirmou que senhores escravocratas mantinham com mulheres escravizadas relações consensuais.
Uma semana depois das declarações na tevê, o delegado foi exonerado do cargo e o presidente da Associação dos Delegados de Santa Catarina lamentava o fato. Eu lamento o nível desses delegados.
A misoginia e o sexismo andaram soltos também na verve de cartunista, ‘jornalista’ e ex-presidente. Nani, cartunista da velha guarda do Pasquim, jornal de resistência à ditadura militar, retratou a coligação do PT com o PMDB como prática de prostituição. Desenhou a candidata Dilma Rousseff rodando bolsinha na esquina e pôs na boca dela expressões de prostituta. Curioso que a coligação do PSDB com o DEM não mereceu o mesmo tratamento. Josias de Souza, blogueiro da Folha/UOL, que já havia associado Dilma e Marta Suplicy aos termos ‘vadias’ e ‘vagabundas’, expõe a charge no seu blog, acrescida do título que Nani não deu originalmente: “Candidata de programa!” Nani havia dado o seguinte título: “Programa de Dilma depende dos partidos”. Ambos são lamentáveis, mas Josias se esmerou na detratação.
O que todos esses casos têm em comum? Todos eles estão permeados de sexismo, todos são resultados de como nós mulheres somos vistas numa sociedade que ainda mantém fortes traços de patriarcalismo.
Da Esquerda à Direita os ‘companheiros’ se esmeram no sexismo
Há exemplos a perder de vista de uma linguagem e comportamento chauvinista em nossa sociedade. Para não cansar os leitores com muitos exemplos, recordo apenas alguns casos.
Em março de 2010, para atacar FHC, Ciro Gomes disse que o ex-presidente tinha uma ‘inveja feminil’ de Lula. Não bastou a Ciro qualificar o ex-presidente como uma pessoa invejosa, ciumenta. Para tornar mais ácido seu ataque ao adversário político, ele associou o sentimento de inveja ao sexo feminino. Fez uso de uma idéia fortemente presente no senso comum de que as mulheres são seres ‘invejosos por natureza’. Desse modo, reforçou o preconceito e atingiu o seu objetivo de desqualificar o adversário, não apenas no campo político, mas também no universo dos machos que dominam o campo da política institucional do Brasil.
Fernando Henrique Cardoso e seus aliados de partido não deixam por menos. É recorrente no discurso do demotucanato que Dilma é ‘sombra’, ‘boneco’, ‘retrovisor’, ‘poste’ de Lula. Enfim, em vários textos e discursos, antes mesmo da largada para a campanha eleitoral, pululam termos que buscam desqualificar a mulher e a política Dilma Rousseff como uma candidata sem méritos próprios.
Em fevereiro de 2010, FHC, em artigo publicado na imprensa nacional, disse que “eleições não se ganham com o retrovisor“, comparando Dilma a um ‘boneco manipulado’ pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Naquele mesmo mês, na tribuna do Senado Tasso Jereissati (PSDB-CE) disse que a petista “é uma liderança falsa, de plástico, de silicone”.
FHC esqueceu a elegância da Sorbonne e até da sociologia de que tanto se orgulha e novamente focou a imagem feminina de Dilma com veios de ironia:
a encenação para a eleição de outubro já está pronta. Como numa fábula, a candidata do governo, bem penteada e rosada, quase uma princesinha nórdica, dirá tudo o que se espera que ela diga, especialmente o que o mercado e os parceiros internacionais querem ouvir”.
O ex-presidente, que nem o PSDB sabe o que fazer com ele, pinta Dilma como uma mulher fútil, que é só aparência, vazia de conteúdo, não é um sujeito histórico, não pensa por si, é facilmente manipulada, mas não pára por aí. Sua misoginia usa também da ironia em relação à idade de Dilma. A candidata do PT é uma mulher que brevemente será avó e, mesmo assim, sua figura é comparada à imagem de uma ‘princesinha’. Os mais ogros, sem os subterfúgios do discurso fhceniano, usam outros termos para se referir às mulheres maduras na política. Eduardo Guimarães fez um texto interessante chamando atenção sobre isso. Quanto ao ‘nórdica’ nem precisamos dizer que seu uso também é proposital: uma forma de destacar a origem étnica e social de Dilma — uma mulher branca, bem educada. O recurso de FHC, aqui, é negativar e descolar a origem social da candidata do PT em contraponto com as origens populares de Lula, na medida em que todo o preconceito social repetido e reproduzido contra Lula, o ‘analfabeto’ não surte mais efeito na maioria da população, diante de um presidente que bateu todos os recordes de popularidade na história do Brasil e que ganhou a projeção e respeito internacional das quais FHC jamais se aproximou.
Marcos Coimbra ao analisar aquele texto de FHC problematiza: se o adversário político dos tucanos na disputa eleitoral pela presidência da República fosse um homem, FHC certamente não se preocuparia com a aparência. Concordo com ele, não vejo na fala das poucas mulheres presentes na política institucional o uso de atributos físicos ou ausência deles para desqualificar seus adversários.  Exemplos como o de Soninha Francine, que desenvolveu um ódio visceral de Marta, são mais raros. As mulheres que ocupam cargos públicos costumam não destratar as demais, desqualificando- se mutuamente, reforçando preconceitos de gênero. Isso me parece ser prática comum aos políticos do sexo masculino.  É saudável, para toda sociedade brasileira, termos candidatas disputando o pleito de 2010 e com condições de vitória.
E quanto ao Nani? O cartunista, após a publicação da charge sexista, chegou a se defender das críticas dos comentaristas de esquerda, lembrando que já tinha retratado Serra e FHC como ‘prostitutas’. A fixação de Nani pelo tema da prostituição como algo condenável e a associação recorrente que o cartunista faz da prostituição à prática política não podem ser usadas como desculpas para falta de humor travestido de preconceito.
Alguns amigos jornalistas de esquerda também demonstraram surpresa com o fato de um cartunista do ex-Pasquim ter sido tão apelativo e preconceituoso. Não me surpreendi. Convivo com muitos amigos de esquerda que têm grande dificuldade de entender o mundo para além da luta de classes. Muitos deles de fato se esforçam cotidianamente para vencer sua cultura machista. Já conseguem enxergar que a dominação masculina sobre as mulheres é estrutural, conseguem perceber a necessidade de se respeitar a construção de outras identidades. Mas abolir de nossas vidas preconceitos é um exercício cotidiano que nem todos estão dispostos.
A turma do Pasquim fez uso do humor, da ironia e irreverência para resistir à ditadura militar, mas seus cartunistas e editores foram bastantes conservadores em relação à emancipação feminina e se opuseram firmemente a toda e qualquer luta das mulheres nesta direção. Às denuncias das feministas brasileiras sobre o caráter estrutural da dominação, expresso nas relações da vida cotidiana, o Pasquim respondia com sarcasmos e zombarias. Como mostra o excelente artigo deRachel Soihet, “Zombaria como arma antifeminista: instrumento conservador entre libertários”,o jornal que lutava contra o regime de exceção:
“(…) voltou-se, igualmente, contra as mulheres que lutavam por direitos ou que assumiam atitudes consideradas inadequadas ao modelo tradicional de feminilidade e às relações estabelecidas entre os gêneros. Ridicularizavam as militantes, utilizando-se dos rótulos de ‘masculinizadas feias, despeitadas’, quando não de ‘depravadas, promíscuas’, no que conseguiam tais articulistas grande repercussão. Depreende-se dessa conduta o temor da perda do predomínio masculino nas relações de poder entre os gêneros, no que evidenciavam forte conservadorismo, contrastante com a atitude vista como libertária de alguns desses elementos em outras situações.”
Geni insepulta: pré-julgada pelo currículo sexual, viva ou morta
Como disse, passei essas últimas semanas com o estômago embrulhado diante das notícias em portais, blogs, e sites pornôs (sim, fiz questão de visitá-los para ver até onde ia a barbárie sexista). Mas não vou me ater a espetacularizaçã o irresponsável da polícia e da imprensa, que anda facilitando a vida da defesa do ex-goleiro Bruno, sendo ou não ele culpado pela morte de sua ex-namorada. A este respeito indico dois bons textos.
O primeiro é do procurador da República, o professor Vladimir Aras, especialista em Direito Criminal, (aqui) que nos lembra que há muita tecnologia para ser usada nas investigações. Ele argumenta que diante do fato dos suspeitos estarem utilizando o direito ao silêncio, o Ministério Público/MG pode, por exemplo, propor acordo de delação premiada ao suspeito certo, pois isso ajudaria a remontar os eventos e localizar o cadáver da vítima ou as provas necessárias para condenar os executantes do crime, mandantes etc. O segundo é o texto do jornalista José Cleves Silva, especialista em investigações de corrupção policial, envolvimento da polícia com tráfico de drogas, armas e assalto a bancos em Minas Gerais. Ele tem larga experiência no contato com a polícia mineira e também foi vítima dessa polícia que não difere muito das dos demais estados: adoram um holofote. Vale a pena ler o seu texto sobre a ação da polícia mineira no caso Bruno, considerando também que o jornalista foi acusado de ter matado sua própria esposa e foi inocentado por unanimidade.
Não foi apenas o espetáculo grotesco da mídia grande impressa e televisiva, que adora as lucrativas notícias de assassinatos brutais envolvendo sexo e celebridades, que causaram espanto a todos aqueles que têm consciência de que vivemos em uma sociedade chauvinista, mas também os comentários grotescos de machistas moralistas e, igualmente, de mulheres que contribuem para disseminar o machismo.
“(…) Se essa maria chuteira não tivesse pegado tanto no pé do Bruno, não teria morrido. Disse a Margarida neste espaço, e foi muito contestada, que se você vê um maremoto sai correndo. Eliza já havia sido ameaçada de morte e, mesmo assim, continuou pegando no pé do Bruno. Ela podia reivindicar seus direitos na Justiça sem ir de Range Rover ao sítio do doidão. Mas, provavelmente, ela era do tipo chiclete.(…) (Trecho de comentário no Viomundo).
Veja e alguns comentaristas do Viomundo – que adoram criticar o jornalismo ‘de esgoto’ daquele semanário — encontraram- se no mesmo sentimento de ignorar o fim trágico de Eliza, culpá-la pela própria morte e lamentar o fato de um ex-favelado, que finalmente ascendeu socialmente, ter jogado o ‘seu futuro’ pela janela, só por causa de uma ‘biscate’. Em todos eles, expressões como: ‘Maria Chuteira’, ‘interesseira’ , ‘piranha’, ‘pegajosa’, ‘chiclete”, ‘puta’ etc. se mesclavam e se complementavam.
Mayara Melo fez um excelente texto a respeito deste tratamento ignóbil dado à vítima Eliza Samúdio e teve a paciência de elencar alguns, dissecando-os.
Trouxa, você fez filho pra pegar pensão? Então cala a boca! Puta é isso. Mulher que faz filho pra mamar dinheiro dos outros, seja quem for! Vagabunda se ferrou!” ou “Estou triste pelo jovem Bruno, um homem realizado na vida profissional e financeira e acabar tudo por causa de um envolvimento com mulher de programa, filho é feito em mulher decente e de honra que isso sirva de exemplo para os homens”.
Ainda há aqueles que disparam, sob moderado pudor: “Era uma aproveitadora, mas ninguém tem o direito de tirar a vida de outra pessoa, por pior que ela seja.”
Wladimir Aras definiu com precisão a condenação pública da vítima:  “Eliza Samudio é uma Geni insepulta. Provavelmente está morta. Mas continua apanhando!”
Nem sua morte foi capaz de calar seus detratores moralistas. Eliza, ainda grávida, foi seqüestrada, sofreu agressões físicas, foi obrigada a tomar substâncias abortivas e quando pediu socorro ao Estado, porque sua integridade física e a do seu filho foram ameaçadas, não obteve proteção garantida pela Lei 11.340/06 (Lei Maria da Penha), porque uma juíza conservadora julgou moralmente a mulher Eliza e ignorou o art. 5º, inciso III:
“Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.”(Fonte: Wladimir Aras).
Como este texto pode ter sido interpretado de outra maneira no caso de Eliza Samúdio? O preconceito incrustado na mente de nossos juízes pode explicar a decisão. Eliza foi pré-julgada pelo seu currículo sexual, condenado moralmente: seu comportamento tornou-a uma pessoa cuja vida vale menos que a das demais.
Para que pudéssemos refletir e agir sobre uma doença social que torna as mulheres vítimas da violência de seus companheiros ou ex-companheiros o Estado teria de fazer valer as leis que garantam nossos direitos. Nossa imprensa poderia ajudar fazendo menos bandalheira e recorrendo mais às análises históricas, antropológicas, sociológicas, políticas sobre as causas do sexismo. Mas restou aos leitores conservadores e consumidores de tragédias as reduções psicologizantes e empobrecedoras que pulularam em todos os meios de comunicação.
Ao abordar este feminicídio Fátima Oliveira fez a crítica a esta abordagem irresponsável, criticou seus pares e mostrou como o conservadorismo de uma juíza que prejulgou a conduta de Eliza, negando-lhe a proteção do Estado, tornou o próprio Estado co-autor de um crime:
(…) é antiético que psicólogos, psiquiatras e psicanalistas se encarapitem na mídia, como papagaios de piratas, chutando que fulano, sicrano ou beltrano é isso ou aquilo outro.
Nem todo homicida é sociopata. Nem todo sociopata mata, mas pode virar assassino se a lei não comparece para punir outros delitos, pois portam personalidades a quem só a lei dá limites (…)
Eterno ser imperfeito, objeto de prazer, consumo ou de pancada de outrem
Seria saudável para todos nós se tragédias anunciadas como a morte de Eliza Samudio ou o estupro da adolescente de 13 anos por outros três adolescentes na casa de um deles, servissem para que Estado e sociedade como um todo refletissem e agissem para diminuir o número escandaloso de mulheres assassinadas ou estupradas por seus companheiros diariamente no Brasil. Teríamos menos Elizas, Mércias, Eloás, Julienes e seus bebêsMarias Islaines, Orestinas
Nossa taxa de feminicídio é bem superior à média de outros países. Segundo o Mapa da Violência no Brasil no período de 1997 a 2007 dez mulheres foram assassinadas por dia, na maioria por seus companheiros atuais ou antigos maridos ou namorados. Segundo Mayra Kubik Mano, a cada quinze segundos uma mulher é espancada no Brasil!
A antropóloga Debora Diniz com muita propriedade argumenta: “A violência não é constitutiva da natureza masculina, mas sim um dispositivo cultural de uma sociedade patriarcal que reduz os corpos das mulheres a objetos de prazer e consumo dos homens.”
Quando temos consciência de que não é natural o desrespeito e, não raro, a violência física, moral, psicológica com que somos tratadas e denunciamos, somos ridicularizadas com o velho e recorrente discurso que nem mesmo os editores e chargistas do Pasquim abriram mão.
De nós é exigido um corpo belo mesmo que não sejamos modelos ou atrizes pornôs. Não basta que, como qualquer ser humano, tomemos banho todos os dias, escovemos os dentes, lavemos as mãos, cortemos as unhas. Tudo em nós é visto e tratado ‘por natureza’ como algo imperfeito que precisa ser arrumado, extraído, modificado: unhas precisam ser ‘feitas’, cabelos precisam ser alisados ou enrolados ou tingidos, os pêlos extraídos das pernas, virilhas, axilas, buço, sobrancelhas, a pele precisa passar por seções torturantes de extração de cravos, manchas; as rugas precisam desaparecer, assim como gorduras, estrias, celulites.
Nosso corpo ainda é coisificado e muitas vezes nos cansamos e nos adequamos. Vivemos, aceitamos e cultuamos a juventude e um determinado padrão de beleza (geralmente branco, magro, loiro e de olhos azuis) e relegamos ao segundo plano todo ser ‘imperfeito’ fora deste padrão. Permitimos que meninas negras com apenas sete anos sejam eletrocutadas no banheiro devido a um  curto circuito em uma maldita chapinha usada para transformar seus cabelos crespos ‘imperfeitos’ em algo ‘apresentavel’ .
Fazemos as mulheres depois dos quarenta serem muitas vezes tratadas como ridículas, porque querem recuperar sua juventude a qualquer custo.
Se a mulher exige de nós o direito de envelhecer com dignidade alcunhamos a de ‘tia velha, mal-humorada’ . Se tem consciência de que sua experiência sexual permite que todo o seu corpo, com ou sem gordurinhas e celulites, ou alguns fios de cabelo branco, exerça desejos; se ela sabe que nada disso a impossibilita de dar e obter prazer junto ao seu companheiro, também não é valorizada.
Não criamos caprinos, devemos formar homens e mulheres saudáveis
Pré-julgamos mulheres que não seguem as normas impostas pela falocracia, mas consumimos o corpo feminino oferecido em diferentes suportes midiáticos.
Nossos valores tão deturpados permitem que jovens adolescentes tenham, por vezes, seu primeiro contato com a prática sexual expondo seu corpo e da parceira no mundo virtual.
A rede SaferNet, por exemplo busca orientar pais e responsáveis sobre exposição da sexualidade:
Não há nada de errado em falar e discutir sobre sexualidade. O erro é não se proteger e não se informar sobre como manter relações saudáveis dentro e fora do ciberespaço;
Proteja seus direitos sexuais e não facilite agressões;
Pais: dialoguem com seus filhos para conhecer o que fazem online e orientá-los. Os valores e limites de sua família precisam ser discutidos também em relação aos comportamentos online. Converse com seus filhos sobre as noções de privacidade e de comportamento de risco para construir limites como proteção e não como proibição;
Pais e educadores: Saiba que você não precisa ser expert em tecnologia, basta transpor a cidadania também para este novo ciber-espaço público;
SaferNet explica que o sexting, prática na qual adolescentes de 12, 13 anos de idade e jovens usam seus celulares, câmeras fotográficas, emails, chats, comunicadores instantâneos e sites de relacionamento para produzir e enviar fotos e vídeos sensuais de seu corpo nu ou seminu – assim como mensagens eróticas para namorados, pretendentes ou amigos – já se tornou moda entre adolescentes por aqui. Reportagem do Terra Magazine mostra a chegada no Brasil de um concurso no qual adolescentes e jovens gravam suas relações sexuais e postam no youtube. Ganha o que tiver mais acesso. A prática não é incomum entre estudantes de escolas de classe média desde pelo menos meados da década de 1990 quando ainda se usava fita VHS. Com a rede, os vídeos apenas são distribuídos em novos suportes e em nível planetário.
Diante desta exposição e permissividade a velha máxima patriarcalista que reduz nossas crias a caprinos em pastos – ‘segurem suas cabras, pois meu bode está solto’ – adquire novas colorações moralistas, renova-se em outros discursos, mas continua em voga. Reprimimos as meninas, reproduzindo os velhos papéis sociais desde a sua mais tenra infância, desde a escolha dos brinquedos.
Meninos recebem carrinho, bola, é permitido a eles até alguns excessos nas lutas com os amiguinhos. Aos leitores pacientes desde longo texto: faz algum sentido a idéia da violência, da valorização da força física no universo masculino parecer algo da essência dos homens?
Meninas recebem apetrechos de cozinha, bonequinhas para desde cedo adequarem-se a um papel naturalizado às mulheres: donas de casa, mães….
Não nos passa pela cabeça que, em pleno século XXI, as mulheres podem, se assim desejarem, jogar futebol e serem atletas excelentes como a Marta, que faz inveja a muito marmanjo apaixonado por futebol, ou que elas tornem-se exímias e cuidadosas motoristas e tenham, inclusive, descontos nas apólices de seguros de automóveis pelo seu comportamento mais civilizado no trânsito. Mesmo assim, elas continuam ouvindo dos ogros que não se civilizam – e acham que trânsito é praça de guerra: ‘volta para o tanque, Dona Maria!’ Os ogros são incapazes até de atualizarem suas ofensas: a venda de eletrodomésticos bate recorde atrás de recorde no Brasil e até as ‘donas Marias’ já compraram sua máquina de lavar roupas.
Para além de combater uma cultura midiática que estimula crianças e jovens a serem consumistas não apenas de objetos, mas de imagens femininas como produtos de consumo, é urgente que pais e professores revejam o quanto são responsáveis pela reprodução de uma educação sexista. Da mesma forma, é preciso refletir também na construção da identidade masculina, a valorização do macho como ‘provedor’, ‘ pegador’, ‘comedor’, desprovido de afeto.
Vários pesquisadores vêm se dedicando à temática da reprodução de preconceitos e discriminações no âmbito escolar. Marília Pinto de Carvalho, em pesquisa de campo junto a professores dos primeiros anos do Ensino Fundamental, investigando o fracasso escolar de meninos negros nas escolas públicas (grupo que permanece há décadas em primeiro lugar nas estatísticas) , aponta-nos, por exemplo, que professoras têm imagens cristalizadas do que seriam comportamentos próprios e/ou adequados aos meninos e meninas, aos negros, aos brancos e aos pobres.  Percepções sobre comportamento de gêneros, pertencimento étnico-racial e origem social interferem na avaliação e expectativa dos professores em relação à disciplina e desempenho escolar das crianças e por, sua vez, na construção de suas identidades.
Dos meninos, as professoras não costumam cobrar capricho nos cadernos e quando se deparam com um caderno limpo, bem cuidado, desenhado, que não pertence a uma menina se surpreendem.  Muitas têm como pressuposto que os problemas de disciplina apresentados por crianças negras, especialmente meninos, estão invariavelmente relacionados ao:
histórico da família desses alunos, alunos que moram em ambientes mais pobres, favelas, estão mais expostos a coisas cruéis, os modelos de adultos que essas crianças têm são pessoas mais rudes” (Depoimento de professora à Marília Carvalho).
Ao longo do trabalho a pesquisadora discutiu com as professoras entrevistadas os resultados parciais da pesquisa. Marília destaca que as professoras eram ‘jovens, comprometidas, sérias em seu trabalho pedagógico’, foram ‘corajosas e perspicazes ao longo de todo o processo’. Mesmo assim, suas avaliações em relação às crianças revelaram-se hierarquizadas:
“Mas se elas não eram abertamente preconceituosas nem discriminadoras, se gostavam de seus alunos e se dedicavam a eles, como suas avaliações revelaram-se tão marcadas por hierarquias de gênero, classe e raça?” (Marília Carvalho).
Precisamos tornar realidade princípios caros aos educadores: educar para autonomia, para o respeito e para a convivência solidária. Isso não pode ser apenas discurso vazio, tem de se tornar prática social. A filósofa Hannah Arendt, refletindo sobre a crise da autoridade, grosso modo,argumenta que toda geração adulta é responsável pela que a sucede. E adultos que abram mão desta tarefa crucial, deveriam também abrir mão de serem pais e professores.
Somos a maioria desempoderada e despolitizada
Nós, mulheres, somos maioria na população brasileira e, entre os cerca de 135 milhões de eleitores aptos a votar, representamos 52% contra 48% dos eleitores do sexo masculino, mesmo assim somos subrepresentadas:
“O balanço de registros em 2008 divulgado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) mostra que a participação feminina na disputa por cargos eletivos é bem abaixo do percentual masculino. De um total de 375.655 registros de candidaturas para cargos nas prefeituras dos municípios brasileiros (prefeito, vice-prefeito e vereadores), apenas 74.837 (20,96%) eram de mulheres.”(Sandra Cruz, UNE).
Considerando as estatísticas de anos de estudo, as mulheres brancas são as mais educadas, mesmo assim, nem elas estão majoritariamente na política. Sandra Cruz aponta que nos cargos de maior nível hierárquico no parlamento, governos municipais e estaduais, secretarias do primeiro escalão do poder executivo, judiciário, sindicatos e reitorias as mulheres não chegam a 20%. Se além do gênero, consideramos o recorte étnico-racial, seja entre mulheres candidatas ou eleitas, o quadro de subrepresentaçã o é ainda mais grave: as negras estão em minoria e as indígenas praticamente ausentes.
Nosso voto fará a diferença e é preciso que tenhamos muito claro quais as políticas propostas que realmente visam combater o sexismo e outras formas de discriminação.
Estejamos atentas às políticas que possam nos empoderar, que permitam que nossas crianças tenham acesso às creches, a uma boa educação, ao lazer, à cultura, a uma infância digna.
São fundamentais as plataformas políticas que defendam a saúde pública no país, a humanização da medicina e que não se exima de discutir, por exemplo, de modo amplo e democrático a discriminalizaçã o do aborto (que, mais uma vez, mata as mais pobres e dentre elas, as mulheres negras, em sua maioria sem recursos para clínicas médicas clandestinas) . Também são importantes o papel de representação das mulheres na mídia, as cotas, micro-créditos, renda mínima cuja gestão dos recursos esteja nas mãos das mães de família etc.
Nestas eleições temos duas candidatas do sexo feminino. As duas com trajetórias políticas em partidos de esquerda. Dilma Rousseff, que ainda muito jovem lutou contra a ditadura militar, foi presa e torturada, e Marina Silva, ex-PT, que iniciou sua luta política com os seringueiros da Amazônia. Para além das diferenças partidárias (que na atualidade as opõem), elas têm feito um debate de alto nível. Dilma tem enfrentado uma campanha detratora e sexista, porque está na frente nas pesquisas eleitorais e porque não se exime de debater, por exemplo, a discriminalizaçã o do aborto como uma questão de saúde pública. Marina tem mais dificuldade para expressar uma posição objetiva em relação a esse tema devido suas crenças religiosas, mas não nega que seja uma questão de Estado.
Para encerrar, recorro a outro artigo do sociólogo Marcos Coimbra, que questiona uma falácia presente na grande mídia e no senso comum conservador. Trata-se da que afirma que mulheres não votam em mulheres.
Nesse artigo Coimbra discute a preferência do eleitorado a partir do recorte de gênero. O texto é de abril, quando Ciro ainda aparecia nas pesquisas de intenção de voto. Há três meses nas pesquisas eleitorais, Dilma e Marina, em todos os estados, tinham desempenho menor entre as eleitoras do que Serra e Ciro. A diferença, inclusive, entre Dilma e Serra era o voto feminino, já que a preferência do eleitorado masculino entre os dois candidatos era igualmente distribuída.
À época, Coimbra argumentava que um fator crucial para explicar as performances dos candidatos era o nível de conhecimento que os eleitores tinham deles. Ou seja, o fator relevante era a informação. Quando homens e mulheres possuíam nível de informação semelhante essas diferenças desapareciam:
“As pesquisas atuais refletem a distribuição desigual da informação entre os gêneros, que deriva, por sua vez, dos papéis sociais diferentes que homens e mulheres desempenham.” (Marcos Coimbra)
Posso garantir que este é um dado importantíssimo. Sou uma mulher educada, com acesso à informação, ativista, politizada. Mas também sou mãe, filha mais velha com pais idosos, tenho uma atividade profissional que demanda longo tempo de concentração, sou blogueira, twitteira, orkuteira, facebookeira.
Para conseguir fazer tudo isso, conto com ajuda da Ana, mensalista que trabalha em minha casa. Ana está de férias. Nos primeiros dias quase enlouqueci para dar conta de todas as demandas, como este texto que agora entrego a vocês e que foi redigido a conta-gotas entre lavar quintal do cachorro, controlar a máquina batendo roupa, ir às reuniões preparatórias do encontro de blogueiros, fazer almoço para a filha (que pegou na vassoura também)…
Então, mulherada, se vocês realmente acham que não podemos mais ser tratadas como seres eternamente imperfeitos, despolitizados, vadios e saco de pancadas, à luta, olho vivo e ação contínua para educar nossos companheiros e nossos filhos, meninos e meninas, para serem pessoas autônomas, colaborativas, respeitosas, mais livres e felizes.
Homarada, a formação de nossos filhos se concretiza quando o modelo está em sintonia com o discurso. O modo como tratam suas parceiras reflete na forma como seus filhos construirão suas futuras relações. Assim como, para que possamos nos informar e escolher a melhor candidatura que continue transformando positivamente o Brasil, precisamos de tempo livre. Saibam, portanto, que suas meias de futebol não vão sozinhas para a máquina de lavar roupas, sua comida não fica pronta se não for preparada e nem as panelas são auto-limpantes.
Se vocês também desejam que sua mãe, irmã, parceira e/ou filha sejam seres bem informados, politizados e autônomos, que tal sair da frente desta tela, convidá-las a ler este texto e se oferecer para lavar aquela pia de louça suja?
Sexismo emburrece e mata. Repensar os papéis sociais cristalizados para mulheres e homens nos liberta, permite que mudemos nossas atitudes, possibilita- nos fazer escolhas mais conscientes tanto na política quanto na vida.

sábado, 14 de agosto de 2010

Wendy Rule - World Between Worlds

Wendy Rule - World Between Worlds

A todos que tem acompanhado o Blog aqui está mais um trabalho magnífico da Wendy, esta linda Australiana devota da Deusa. Estarei pouco a pouco postando aqui e em breve teremos Guided by Venus, seu último trabalho lançado neste ano. Agradeço a presença de todos vocês e apreciem "O Mundo Entre Mundos".

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On World Between Worlds, Wendy Rule’s beautifully dark soundscapes guide us into an Otherworldy realm of Celtic myth and mystery.

Exploring the deep, healing qualities of the underworld with songs such as Singing to the Bones and Slow Down, the album is a meditative journey into the full spectrum of human emotion.

Highlighting the intricate layers of Wendy’s voice, and the gorgeous cello of Rachel Samuel, World Between Worlds is an important album, offering an insight into the complex wisdom of Pagan philosophy.


World Between Worlds

Tracks:
1. Dissolve (5.15)
2. The Call (5.13)
3. Animus (4.24)
4. Singing to the Bones (6.06)
5. Three Colours (5.37)
6. Hail to the Moon (3.10)
7. World Between Worlds (6.33)
8. Under the Willow (5.21)
9. Slow Down (6.49)
10. Evolve (1.51)
11. Entropy (6.00)
12. Inanna (6.40)
13. Creatures of a Day (4.16)


Credits:
Released in 2000
Produced by Siiri Metsar at Fortissimo, Melbourne
Featuring Rachel Samuel (cello)
Craig Patterson (piano)

Download: http://www.4shared.com/file/UvEbDBlY/Wendy_Rule_-_World_between_wor.html

terça-feira, 10 de agosto de 2010

Wendy Rule - Zero

Wendy Rule - Zero

Wendy Rule’s debut album Zero is a visionary journey into the world of light and shadow. Dreamy, percussive and lush, the listener is transported through a cinematic landscape of Myth and Magic. Each song is an exploration of Wendy’s personal journey as a practicing Pagan Witch, offering a level of depth and wisdom rarely experienced in modern music. Featuring Rachel Samuel on cello, with songs that range from the joyous heights of the title track to the soft sadness of Sirens and Frost at Midnight, Zero is a brave and beautiful offering.


Tracks:
1. Continental Isolation (8.10) 
2. Sirens (4.43)
3. Chariot (3.39)
4. Demigod (3.40) 
5. Child The First (3.11)
6. Prometheus (6.15)
7. Beltane (3.49)
8. Odyssey (5.29)
9. Seline Of The Infinite Solution (3.14)
10. Psyche's Sisters (6.56) 
11. Falling Behind Me (2.02) 
12. Zero (6.00) 
13. Frost At Midnight (6.08) 


Credits:
Released in 1996
Produced by Adam Calaitzis at Toyland, Melbourne
Featuring Rachel Samuel (cello)
And Craig Patterson (Piano)
Tamanho: 75 Mb

Download: http://www.4shared.com/file/aWkwtMGF/Wendy_Rule_-_Zero_1996_by_3vez.html

domingo, 8 de agosto de 2010

Das representações míticas à cultura clerical: as Fadas da Literatura Medieval







Revista Brasileira de História
Print version ISSN 0102-0188
Rev. bras. Hist. vol.19 n.38 São Paulo  1999

doi: 10.1590/S0102-01881999000200010 

Das representações míticas à cultura clerical: as Fadas da
Literatura Medieval

Antônio P. V. MorásDoutorando História Social-FFLCH/USP


RESUMOO presente artigo estuda a permanência dos mitos celtas no folclore medieval e como seus temas e motivos são assimilados pela cultura clerical do século XII em diante. O principal propósito do mesmo é analisar a dimensão simbólica dos mitos celtas e o deslocamento de seu sentido original nos textos produzidos no meio cavaleiresco.
Palavras-chave: Cultura Medieval; Mitos; Representações.

ABSTRACT The present article studies the constancy of the celtic myths in the medieval folklore and how its themes and motifs are assimilated for the clerical culture of the XIIth. century and forth. The principal purpose of this article is analyse the symbolical dimension of the celtic myths and the displacement of its original sense in the literary texts produced in the chivalrous environment.
Keywords: Medieval Culture; Myths; Representations.


As fadas encontraram seu espaço na literatura de entretenimento nos séculos XII-XIII. Com o despontar da literatura narrativa de Corte na segunda metade do século XII, - produção literária esta em língua vulgar e constituída em torno dos principados regionais que melhor souberam se adequar à expansão comercial e ao desenvolvimento urbano do período, como é o caso dos condados de Champagne e Flandres -, o tema da fada que se deixa surpreender pelo cavaleiro por quem se apaixona, cumulando-o de benefícios e riquezas, torna-se uma constante nos lais e romances de cavalaria franceses do final do século XII em diante, surgindo com ele todo um conjunto de referenciais relacionados ao mundo das fadas: animais maravilhosos que conduzem o cavaleiro ao outro mundo feérico, rivais ou inimigos declarados que ele encontra por lá etc. Contudo, as fadas e as criaturas feéricas em geral também acharam acolhida na literatura escrita em latim produzida no âmbito da Corte de Henrique II Plantagenet. Com a ascensão deste monarca ao trono da Inglaterra, jovens instruídos nas universidades francesas e italianas foram contratados para a função de "curiales", funcionários especializados na administração jurídica e fiscal do reino. Duas autênticas coletâneas de maravilhas surgirão deste ambiente de letrados prestigiados que fazem parte da comitiva real: o De Nugis Curialium, de Walter Map, obra escrita entre 1181 e 1194, e os Otia imperialia, de Gervais de Tilbury, esta última redigida em 1210, depois que Gervais tinha abandonado o séquito de Henrique II, e dedicada ao imperador Othon IV de Brunwick. Apesar das inevitáveis diferenças de estilo e propósitos entre a literatura escrita em latim e a literatura vernácula no período citado, os temas e motivos que se ligam ao mundo feérico apresentam evidentes semelhanças em ambos os gêneros literários, permitindo constatar que eles partem de um núcleo comum.

No estágio atual das pesquisas, não pairam dúvidas sobre o fundo comum de onde surgiram as concepções e modelos relativos às fadas e ao mundo feérico em geral presentes na literatura medieval dos séculos XII-XIII: os mitos e lendas célticos conservados nas tradições folclóricas do norte da Europa, notadamente em Gales, na Irlanda e na Bretanha francesa. Levando-se em conta o valor intrínseco do estudo das imagens e modelos literários para a compreensão da sociedade medieval, dois enfoques diferentes a respeito das fadas e das criaturas feéricas consolidaram-se nos trabalhos históricos das últimas décadas. Um deles, inspirado nos estudos de E. Köhler sobre as tensões entre o ideal cavaleiresco e a realidade social e econômica do século XII1, analisa a existência e a ação das fadas e dos entes feéricos na literatura do período como um contraponto - de valor compensatório - às pressões que se abatem sobre a cavalaria da segunda metade do século XII em diante. O outro enfoque, mais antigo, inspira-se nos estudos folclóricos em geral e nos trabalhos de R. S. Loomis2, dando ênfase aos substratos célticos revelados a partir do ciclo arturiano, os quais se procura identificar com precisão.

Não obstante os resultados obtidos por estas linhas de pesquisa, é inegável que, em termos metodológicos, ambos os enfoques operam um duplo desconhecimento de seu objeto de estudo. No primeiro caso, ignora-se os substratos arcaicos e as estruturas míticas inseridas nas narrativas feéricas de forma a valorizar os determinantes de ordem social e econômica da época em que tais textos foram produzidos. No segundo caso, relega-se a uma posição ínfima ou secundária a conjuntura social e cultural que deu origem a estes textos em prol de modelos míticos que tendem a ser considerados inalterados. Tanto em um caso como no outro, as conclusões obtidas inclinam-se para uma visão parcial, senão tendenciosa, do problema. E a tendenciosidade revela-se em todos os seus matizes quando se atribui a modelos míticos arcaicos um significado anacrônico que se pretende universal ou transcultural.

Para fugir a este dilema epistemológico, a melhor solução parece ser a análise dos complexos míticos relativos às fadas presentes na literatura medieval em termos de padrões de significados estruturados que revertem ao mundo céltico e, uma vez decodificadas as linhas gerais destes padrões de significados, o exame das transformações verificadas nestes substratos míticos no contato com a cultura clerical do século XII. Deste modo, evita-se uma atribuição errônea de significados às estruturas míticas inseridas nas formas literárias do período, ao mesmo tempo em que se possibilita a avaliação clara da inflexão dada a estas estruturas míticas pela cultura clerical.

Nesse sentido, este estudo colocará em primeiro plano a literatura escrita em latim produzida pelos "curiales" da corte de Henrique II, não apenas porque estes textos são menos conhecidos do que os "lais" e romances de cavalaria franceses, mas principalmente porque o De Nugis Curialium e os Otia Imperialia não deixam de revelar uma certa inclinação etnográfica (dentro das condições da época, bem entendido). As duas obras não perdem a oportunidade de registrar histórias e acontecimentos maravilhosos que são encarados como um contraponto à realidade cotidiana do mundo cortesão. No De Nugis Curialium, de Map, os galeses são um modelo negativo do mundo dos "curiales" por sua selvageria e seus costumes estranhos. Já os Otia Imperialia, de Gervais de Tilbury, são uma autêntica coletânea de maravilhas das diversas regiões pelas quais ele passou, o que lhe valeu inclusive, comparações com os catálogos compilados pelos folcloristas. Não se deve esquecer, contudo, que os dois autores são eruditos forjados no ambiente universitário do século XII.
Como eram representadas as fadas nas histórias do De Nugis Curialium, a mais antiga das duas obras citadas? Examinemos a história de Gwestin Gwestiniog conforme Map a relatou:
Gwestin Gwestiniog habitava nas cercanias do lago Brycheiniog, que tinha duas milhas de diâmetro. Durante três noites de lua cheia ele vê um grupo de mulheres dançar em seu campo de aveia e em seguida precipitar-se dentro do lago. Ao seguir estas mulheres, Gwestin as ouve murmurar como ele poderia capturar ao menos uma delas, e assim, procedendo de acordo com o que ouvira, ele apodera-se de uma delas e a desposa. As primeiras palavras que a mulher lhe dirige foram que ela voluntariamente o serviria e lhe obedeceria até o dia em que, querendo seguir os gritos vindos do outro lado do Llyfni, um rio das proximidades do lago, ele a golpeasse com o arreio. É o que se passa; após terem tido vários filhos, ele a golpeia com seu arreio e, ao retornar, a surpreende fugindo com as crianças. Ele as persegue e com dificuldade consegue arrancar-lhe uma das crianças, Triunein Vagelauc3.
Subentende-se, pelo relato, que a fuga da mulher de Gwestin dá-se para dentro do lago de onde ela tinha saído, fato este que será comprovado mais adiante. Na seqüência de sua obra, Map inclui outro episódio bastante similar ao supra citado. Trata-se da história de Eadric, o Selvagem:
Eadric, o Selvagem era um homem de grandes proezas, um senhor de Ledbury North. Voltando da caça por volta da meia-noite, Eadric erra pela mata e encontra uma casa de grandes dimensões, onde vê uma assembléia de mulheres nobres que se punham a dançar. Com a ajuda de seu pagem, Eadric consegue raptar aquela que lhe era mais desejável, e durante três dias e três noites obtém prazer com ela. No quarto dia ela lhe dirige a palavra e lhe diz que eles serão felizes e Eadric será próspero em bens e saúde enquanto não reprovar as irmãs dela, que ele viu a dançar, as matas e o lugar de onde ela veio. Se ele o fizesse, ela partiria, muitas desgraças lhe sucederiam e sua imprudência o levaria à morte. Um dia, Eadric retorna da caça por volta da meia-noite e, não encontrando sua mulher, ele a censura ao reencontrá-la, dizendo: 'Foram tuas irmãs que te guardaram tanto tempo?' À menção de suas irmãs ela imediatamente desaparece. Eadric a procura desesperadamente, mas nunca mais torna a achá-la e morre numa dor contínua. Entretanto, a mulher lhe deixa um filho, Alnoth, que na velhice foi atingido por uma paralisia e é curado pelas relíquias de S. Ethelbert, legando ao santo as terras que herdara de Eadric4.
Aqui já é possível notar o esforço de Map para acomodar o substrato céltico destas histórias às concepções e doutrinas cristãs. Ao encerrar a história de Eadric e seu filho Alnoth ele afirma:
Temos ouvido falar de demônios íncubos e súcubos e do perigo das relações sexuais com eles, mas nunca descobrimos nas histórias da Antigüidade herdeiros ou crianças que terminaram sua vida felizes e prósperas como este Alnoth, que dá toda sua herança ao Cristo para sua cura e passa o resto dos dias a seu serviço como peregrino.
A desconfiança do autor em relação a estas fadas já se evidenciara no decorrer da narrativa. Quando Eadric resolve capturar a fada por quem tinha se apaixonado, o texto esclarece que ele "já tinha ouvido falar de povos errantes, de bandos noturnos demoníacos", mas que, "cego pelo Cupido", ele prossegue em seu intento. A mesma desconfiança também acha-se presente na história de Gwestin Gwestiniog. Na continuação do relato, Triunein, o filho resultante da união de Gwestin com a fada, teve a infelicidade de seguir um rei fanfarrão que perde todo seu exército ao desafiar outro rei mais poderoso. Contava-se que Triunein tinha sido salvo por sua mãe e agora vivia com ela debaixo do lago, mas Map nega tal proeza à fada, afirmando que tudo não passava de um embuste que podia ser facilmente inventado a respeito de um desaparecido.
O aspecto demoníaco da fada, no entanto seria reforçado com muito mais ênfase na seguinte história narrada por Map:
Hennon, dito 'dos Grandes Dentes', encontra por volta do meio-dia na costa normanda uma jovem belíssima acompanhada apenas por outra jovem. Apaixonando-se por ela, Hennon oferece-lhe proteção e termina por desposá-la, união da qual resultam três belas crianças. A jovem freqüentava a igreja com assiduidade e constantemente auxiliava as viúvas, os órfãos e os indigentes, mas a mãe de Hennon observou que ela sempre entrava na igreja após a aspersão com água benta e se retirava antes da eucaristia. Tomada pelas piores suspeitas, ela passa a espionar a jovem, e um domingo de manhã bem cedo, através de um buraco na parede, a mãe de Hennon vê sua nora entrar no banho e transformar-se num dragão, o mesmo sucedendo depois com a outra jovem que sempre a acompanhava. A mãe de Hennon alerta seu filho e chama um padre, que pega a jovem e sua serva desprevenidas e as asperge com água benta. Em um salto rápido elas atravessam o teto impelindo grandes gritos e abandonando para sempre a casa que as abrigou. Sua numerosa progenitura, no entanto, subsiste mesmo depois de seu desaparecimento5.
Nos Otia Imperialia, de Gervais de Tilbury, há uma historieta que guarda nítidas semelhanças com esta, tendo por protagonista o senhor do castelo de Rousset:
Na província de Aix, o senhor do castelo de Rousset, chamado Raimond, encontra ao longo do regato de Lar uma dama de uma beleza sem par, ornada com suntuosos adornos. Ele lhe faz a corte e ela lhe diz que concordaria com essa união desde que eles se casassem. Inflamado pelo desejo, Raimond aceita, mas ela acrescenta que, enquanto viverem sob o mesmo teto, ele gozará de grande prosperidade, mas jamais deverá vê-la nua. Caso isto acontecesse, ele perderia toda a prosperidade e passaria a levar uma existência miserável. O matrimônio é realizado e o cavaleiro vê-se cumulado de riquezas, ultrapassando seus pares, e tendo muitos filhos nascidos desta união. Transcorridos muitos anos, Raimond volta um dia da caça e, movido por um impulso, atravessa o cortinado em que sua mulher se mantinha para tomar banho, vendo-a transformada numa serpente. Ela enfia sua cabeça sob a água do banho e desaparece. Nunca mais ela é vista, mas as amas dizem ouví-la à noite, quando ela retorna para ver suas crianças. O cavaleiro perde em seguida a maior parte de sua prosperidade e o favor dos grandes, mas uma de suas filhas desposa um membro da nobreza de Provence, e sua progenitura persistia ainda ao tempo de Gervais6.
Ao contrário da história de Hennon dos Grandes Dentes, e semelhante aos exemplos anteriores, a narrativa de Gervais comporta um interdito claramente expresso: jamais ver a fada nua. Aqui também a dupla forma mulher/serpente é uma alusão à natureza demoníaca da fada, similar ao dualismo mulher/dragão do exemplo de Map. Devido à semelhança de motivos, diversos autores já fizeram a aproximação entre estas fadas demoníacas e Melusina, a fada ligada à casa dos Lusignan, no Poitou, à lenda homônima redigida no século XIV por Jean de Arras7, ainda que suas posições divirjam radicalmente em muitos pontos. C. Lecouteux, por exemplo, supõe que três grupos de contos, cada um deles organizado em torno de um tema central, estão na origem de Melusina: o primeiro refere-se ao interdito; o segundo à união de um súcubo com um ser humano, enquanto o terceiro trata de serpentes8. J. Markale, por sua vez parte do princípio que Melusina é um dos arquétipos de uma deusa mãe ancestral "atemporal e a-espacial em sua textura mais profunda", deusa mãe que se encarnaria em diversos personagens míticos ou religiosos como Lilith, a Esfinge e, em sua forma mais atenuada, até mesmo Virgem Maria. Tomando este arquétipo da deusa-mãe como eixo condutor de sua análise, o autor tenta decifrar o simbolismo implícito na lenda de Melusina recorrendo a teorias psicanalíticas (ele chega a citar o mito de Édipo): Melusina, assim como a Esfinge, é um monstro bissexual na realidade; o cerne desta lenda é a imagem do andrógino, personificada em sua cauda de serpente, simbolicamente um falo9.

A tese de Markale é um excelente exemplo de como o desconhecimento do significado simbólico original de mitos e lendas presos a uma realidade arcaica induz o pesquisador a uma interpretação anacrônica dos mesmos, amparado em teorias contemporâneas que nunca se comprovaram universalmente aplicáveis. Quanto às premissas de C. Lecouteux, ainda que em linhas gerais plausíveis, não deixam de se mostrar incorretas na definição dos temas centrais que compõem a lenda melusiana, falhando na explicação do interdito por se apoiar num aparato conceitual e metodológico deficiente. A argumentação destes autores é relevante para este estudo porque eles partem precisamente dos textos transcritos acima.

O principal equívoco da tese de J. Markale é o de conduzir a análise da lenda melusiana enquadrando-a totalmente ao arquétipo da deusa-mãe. Deste modo, sem perceber, vai viciando suas interpretações do tema. Para dar prosseguimento à linha metodológica que traçou para seu estudo, é, primeiramente, obrigado a admitir que "o relato melusiano forma um todo coerente" cujo tema organiza-se em torno da androginia manifestada simbolicamente pela cauda de serpente. Entretanto, na história de Hennon dos Grandes Dentes, a fada transforma-se num dragão, não numa mulher que é serpente da cintura para baixo. Map é mais preciso sobre este ponto: a mulher sai de seu banho sob a forma de dragão, entra numa coberta que sua serva tinha desdobrado e a reduz em pequenos pedaços com seus dentes, evidenciando assim que ela também era um dragão na metade superior de seu corpo. Isto nos faz pensar na estranheza de um tema mítico organizado em torno da imagem da androginia, expressa pela cauda de serpente, que perde seu núcleo simbólico central e mantém preservada a riqueza de detalhes adicionais (perceptível na semelhança entre a história de Hennon dos Grandes Dentes do De Nugis Curialium, e a de Raimond de Rousset dos Otia Imperialia). Na verdade, J. Markale não pode advogar uma estrutura mítica total para a lenda de Melusina porque Jean de Arras, o autor do Roman de Mélusine, afirma na introdução de sua obra que ele a compôs "seguindo crônicas que estima ser verídicas", além de reforçar ao seu relato com as aparições sobrenaturais dos Otia Imperialia de Gervais de Tilbury10, entre as quais ele destaca justamente o caso de Raimon de Rousset.

Melusina é uma criação literária de Jean de Arras que tem por base algumas histórias que circulavam pelo Poitou e relatos feéricos registrados por cronistas, com ênfase no já citado Gervais de Tilbury. Além disso, é pouco provável que o mito de uma fada serpente ou dragão existisse desde os tempos da ocupação celta e que Melusina fosse encontrada somente no Poitou, já que motivos folclóricos envolvendo fadas célticas podem ser encontrados em toda a Irlanda, Grã-Bretanha, França e vastas regiões da Alemanha e da Europa central.

O estudo de C. Lecouteux, por sua vez, começa com a análise dos relatos feéricos que se associam, na estrutura narrativa, à lenda de Melusina. Ocorre que sua análise prende-se apenas aos aspectos formais destes relatos, não dando a devida atenção à genealogia dos temas e motivos que se somam em Melusina. Assim, torna-se problemático afirmar que o segundo grupo de relatos somados às lendas melusianas refere-se à união de um ser humano com um demônio súcubo, enquanto o terceiro prende-se às serpentes enquanto animais demoníacos. Considerando que o fundamento mítico de Melusina acha-se nas fadas célticas que se acasalam com humanos, até que ponto pode-se falar em demônios súcubos? O tema das serpentes forma um conjunto distinto dos outros dois, como supõe Lecouteux, ou trata-se simplesmente da resultante de uma adaptação das fadas célticas aos pressupostos da cultura clerical?

A questão do interdito que é rompido pelo mortal e provoca o desaparecimento da fada também se acha mal resolvido no estudo de C. Lecouteux, e é justamente neste ponto que as contradições metodológicas do autor tornam-se latentes. Lecouteux não distingue o "mito" do "conto maravilhoso". Baseando-se nas teorias de Von der Leyen, o homem primitivo, "supersticioso e medroso, não faz diferença entre o sonho e a realidade", e é esta ambivalência que estaria na raiz dos mitos, uma vez que sua dimensão onírica permite ao homem obter o que lhe é recusado pela vida real11. O fundamento mítico da história de Melusina, então, seria de ordem psicológica: a fada garante ao ser humano uma compensação das adversidades da vida e também do medo da morte, pois acenar com a perspectiva da imortalidade no outro mundo12.

Lecouteux não parece compreender a diferença entre o mito e a obra literária. Um conto ou uma novela podem derivar de um dado complexo mítico, mas sua própria existência numa forma literária já pressupõe um trabalho de elaboração realizado pelo autor, como é o caso das histórias relatadas por Walter Map e Gervais de Tilbury, e noRoman de Mélusine, de Jean de Arras. Os mitos, por sua vez, constituem-se num conjunto definido de representações do mundo organizadas justamente como coleções de relatos que estruturam um modelo simbólicoda realidade13. A função do mito nas sociedades arcaicas não é, de fato, fornecer mecanismos de compensação psicológica para primitivos "supersticiosos", que não distinguem o sonho da realidade, e sim permitir uma construção ontológica do universo que associe as categorias da vida social aos pressupostos de uma ordem cósmica, dando, deste modo, um sentido ao arbitrário da existência humana. Por consegüinte, ao invés de se examinar as formas assumidas pelo interdito nas historietas de Walter Map e de Gervais de Tilbury - onde ele já passou por diferentes formas de manipulação literária a par das intenções do autor - seria mais apropriado buscar sua gênese e significado a partir da análise das representações simbólicas reveladas pelos substratos míticos presentes nas sagas e epopéias célticas, uma vez que é o contexto simbólico dos mitos celtas que dá origem às apresentações literárias do interdito. É o que tencionamos fazer deste ponto em diante.

Em todos os relatos supra-citados há um padrão que se repete: uma fada acasala-se com um mortal gerando filhos. Note-se que o interdito não se acha presente em todos os exemplos, pois na história de Hennon dos Grandes Dentes não há nenhuma menção a ele: a fada parte com sua serva porque foi aspergida com água benta. Nos mitos celtas, este padrão de acasalamento verifica-se não apenas entre um mortal e uma divindade. Ele é válido para as relações entre as próprias divindades. Os mitos das invasões sucessivas da Irlanda incluem um episódio no qual Dagda, um dos deuses chefes dos "Tuatha de Danann" (uma das raças míticas que invadem a Irlanda), encontra a Morrigan, uma rainha dos espectros, deidade ligada à morte e à carnificina, nas margens do rio Unius. Dagda mantém relações sexuais com ela, e como resultado desta união, Morrigan promete ajudar os "Tuatha" contra os "Fir Bolg" (a terceira raça de invasores da Irlanda, anterior aos "Tuatha") por intermédio de sua influência sobre as guerras14. Como a tribo de Dagda sairá vencedora deste combate, o mito pressupõe que Morrigan teve um papel a desempenhar na vitória dos "Tuatha".

Este padrão hierogâmico de relações entre divindades, ou entre um mortal e uma divindade, é uma característica dos mitos celtas, e ele é muito mais revelador no segundo caso, como pode ser observado na história de Pwyll, príncipe do Dyvet, a primeira rama do "Mabinogi". Esta obra é uma coleção de contos medievais de origem galesa que conservou muito das tradições mitológicas celtas. O segundo episódio da história de Pwyll narra o casamento deste rei do sul de Gales com uma rainha do Outro Mundo. É preciso salientar que no primeiro episódio de sua história, Pwyll torna-se um rei iniciado. Por ter cometido uma descortesia durante uma caçada a Arawn, o senhor de "Annwfyn" ("o abismo", isto é, o "Outro Mundo"), Pwyll consente em trocar de lugar com ele, assumindo sua aparência e o governo de "Annwfyn", enquanto Arawn faz o mesmo em relação ao reino de Pwyll. Esta troca de identidades e funções teve a duração de um ano, e neste período Pwyll vence o rival de Arawn no Outro Mundo enquanto este governa o reino de Pwyll de um modo que excede as expectativas de seus súditos. Quando retorna ao seu reino, Pwyll passa a ser chamado "Pwyll Penn Annwfyn" (Pwyll, "Senhor dos Abismos").

Mas o segundo e o terceiro episódios de sua história revelam-se mais interessantes para este estudo:
Pwyll sobe com seus homens a colina maravilhosa de Arberth, onde sempre se realizam prodígios para aqueles que sobem até seu cume. De lá, vê uma mulher montada num grande cavalo branco que atravessa o caminho principal e que partia da colina. Durante dois dias, se repete o mesmo prodígio quando Pwyll encontra no cume da elevação, e em ambas as ocasiões ele manda um de seus homens interceptar a amazona. É em vão que o faz: por mais que o cavaleiro tentasse, seu cavalo mantinha-se sempre à mesma distância do cavalo da jovem. No terceiro dia, é o próprio Pwyll que a persegue e, vendo que não conseguiria alcançá-la, pede para que ela o espere. Como a jovem acatasse seu pedido, Pwyll fica sabendo que seu nome é Rhiannon, e que ela veio porque queriam casá-la com outro, embora ela estivesse interessada nele, Pwyll. A esta altura, já fascinado pela beleza de Rhiannon, Pwyll acompanha-a até o Outro Mundo e consegue superar Gwawl, o outro pretendente da jovem, graças a um astucioso estratagema armado pela própria Rhiannon, que o leva a passar por um mendigo para enganar o rival do Outro Mundo. Como resultado de sua vitória, Pwyll traz Rhiannon para seu reino. 

Rhiannon mostra-se uma rainha pródiga em presentes e liberalidades aos súditos de Pwyll. O segundo ano de seu reinado continuou a ser próspero. Entretanto, passado três anos, ela ainda não havia dado um filho a Pwyll. Por causa disso, os parentes mais próximos de Pwyll, seus irmãos de leite (alusão ao 'fosterage', aparentamento por criação), pedem-lhe que repudie sua esposa. Pwyll adia sua decisão por um ano, e neste mesmo ano Rhiannon tem um filho nos domínios da corte de Arberth. Contudo, a criança desaparece misteriosamente na noite de seu nascimento, e as parteiras, para evitar que qualquer punição recaísse sobre elas, alegam que Rhiannon devorou seu próprio filho, após tê-la untado com o sangue de uma cachorra enquanto dormia. Como penitência por seu suposto crime, Rhiannon deveria permanecer durante sete anos nos limites de Arberth, contar a todo viajante sua história e oferecer-se para levá-lo até a corte montado em suas espáduas. E assim passou-se meio ano. Teyrnon Twryv Vliant, um senhor do sudeste de Gales, possuía uma égua insuperável em formosura que paria sempre na noite de primeiro de maio, mas o potro jamais era encontrado. Resolvido a elucidar este mistério, Teyrnon pegou suas armas e pôs-se a montar guarda na noite de primeiro de maio. No começo da noite a égua pariu um potro de belas proporções, e neste momento Teyrnon ouviu ruídos vindos do exterior e viu uma grande garra entrar pela janela e agarrar o potro pela crina. Imediatamente ele pegou a espada e cortou este braço, que caiu no interior do recinto com o potro. Correndo para fora da casa, Teyrnon não achou ninguém, mas ao regressar encontrou um menino com uma capa de brocados e cabelos dourados ao lado do potro. Teyrnon descobririu então que se tratava do filho de Pwyll e, avisando-o do ocorrido, deu fim à penitência de Rhiannon15.
A aparente estranheza deste conto explica-se facilmente se preenchermos algumas lacunas. Em primeiro lugar, a colina de Arberth. É ao subir na colina que Pwyll e seus homens tomam contato com Rhiannon. Nos mitos e sagas célticos, os outeiros e demais elevações do solo e o fundo das águas são os locais de acesso ao "Sid" (ou "Sidhe"), o Outro Mundo das tradições célticas, que mais raramente também se encontram em grutas oucavernas16. Note-se que nos exemplos extraídos de Walter Map e Gervais de Tilbury as fadas são encontradas nas proximidades das águas por seus futuros esposos, à exceção da história de Eadric o Selvagem, que encontra a fada numa estranha casa no meio da mata. Já Rhiannon, é em sua origem, uma divindade do Outro Mundo. Seu nome vem de Rigantona, "a grande rainha", e a aproximação entre Rhiannon e Epona, a deusa associada aos eqüídeos nos monumentos galo-romanos, já foi sugerida por muitos estudiosos da mitologia celta17. É necessário admitir que esta aproximação é capaz de esclarecer muitas das características da história de Pwyll, pois, de fato, Rhiannon é associada aos cavalos no texto em questão. Primeiro, apresenta-se montada num cavalo para Pwyll (exatamente como se representava Epona em muitas estátuas galo-romanas). Depois, a penitência que lhe é imposta exige que ela transporte sobre seus ombros os viajantes que vêm a Arberth, alusão evidente à sua forma eqüídea.

As concepções míticas presentes no nascimento de Pryderi também merecem alguns comentários. Ele nasce e desaparece logo em seguida, sendo reencontrado apenas quando Teyrnon decepa o misterioso braço que tentava se apoderar de seu potro. A evidente associação entre a égua extraordinária de Teyrnon e Rhiannon parece evocar, à primeira vista, algum vestígio de relações totêmicas. Embora não se possa descartar a possibilidade de alguma forma de totemismo no longínquo passado dos povos que se estabeleceram no continente europeu, no presente caso, o modelo parece ser mais complexo. Pryderi está intimamente relacionado às forças do Outro Mundo, por isto ele só poderia vir a este mundo conduzido por um animal que também fizesse alusão às forças sobrenaturais. Pryderi tem uma roupa de brocados, que é uma caracterização típica dos habitantes do Outro Mundo, e cabelos cor de ouro. Num sentido simbólico, ele é uma personificação do sol, que desaparece no inverno e retorna no verão: lembremo-nos que a noite de primeiro de maio antecede a festa de Beltane, o início do ciclo diurno na civilização celta18. A grande mão com garras que invade a casa de Teyrnon representa as forças das trevas, que tentam capturar um potro prodigioso e mantê-lo junto de Pryderi no Outro Mundo. Ao destruir esta possibilidade, Teyrnon garante a vinda de Pryderi a este mundo. Nos povos indo-europeus, o cavalo é, via de regra, o animal que transporta os corpos celestes e um grande número de divindades para este mundo, como é o caso nos mitos escandinavos descritos na Edda de Snorri Sturluson, onde o sol e a lua são transportados pelo ar em carros puxados por cavalos19, e também nos hinos védicos, onde os dois "corcéis ardentes" de Indra encarregam-se de transportar tanto a ele como ao sol20.

Ao fazermos referência à mitologia indo-européia, convém mencionar uma de suas características implícitas que se adequa muito bem aos estudos realizados nesta área por G. Dumézil. De acordo com os contornos assumidos por estes mitos, a soberania, a supremacia militar e as forças ligadas à prosperidade e à fertilidade têm sua origem no exterior da sociedade e estão associadas a divindades ou semi-divindades que estabelecem pactos ou relações com os mortais que se mostram aptos a usufruírem destes poderes e vantagens. Usufruir, não dominá-los realmente. Estes poderes pertencem às divindades e seres do Além mítico, e sua recepção no seio das sociedades indo-européias é decorrência do modo pelo qual estas sociedades representam, no plano da cultura, a formação de suas categorias sociais.

O relacionamento entre homens e deuses assume diversas formas conforme as ramificações apresentadas pelos povos indo-europeus. É assim que, na literatura germano-escandinava, os guerreiros que ascendem à realeza são patrocinados por Odin-Wotan ou descendem dele, ou os cinco heróis Pandava do "Mahabharata" hindu são gerados por divindades associadas ao esquema trifuncional indo-europeu definido por G. Dumézil21. No caso específico dos celtas, a organização geográfica do mundo é resultante da partilha da terra entre os homens e os gênios e divindades que vivem nos locais de acesso ao "Sid". No entanto, são as "gentes do Sid" que detêm a abundância e a habilidade nas artes e poderes sobrenaturais (ou considerados como tal), conforme pode ser comprovado na história de Pwyll.

Ao se relacionar com seres do Outro Mundo, Pwyll traz para seu reino a justiça e o equilíbrio na distribuição dos benefícios e honras (resultado da troca de identidade com Arawn no primeiro episódio) e a abundância inesgotável do Outro Mundo (benefício oriundo de seu casamento com Rhiannon), predicados da função de soberania. Vale lembrar que "pwyll" em galês significa precisamente "sabedoria": o personagem é um rei sábio justamente por compatibilizar as forças dos dois mundos. Um outro ponto a ser destacado é que estas mulheres feéricas, ainda que tragam as benesses do Outro Mundo para o mundo dos mortais, são sempre encaradas com desconfiança pela comunidade. Esta desconfiança explica-se pelo fato de tais mulheres não poderem se enquadrar satisfatoriamente nos padrões de relações determinados pela sociedade celta. Pesa sobre elas uma ambigüidade estrutural irremovível: quando se acasalam com um rei, um guerreiro ou um rico proprietário de terras (representantes das distinções culturalmente estabelecidas pela hierarquia social), estas mulheres passam a integrar a sociedade ao mesmo tempo em que permanecem representantes de uma realidade exterior que transcende os poderes e normas existentes na sociedade que as abrigou. Tal incompatibilidade não se manifesta quando este padrão hierogâmico efetiva-se com dois parceiros do lado divino, como foi o caso com Dagda e Morrigan citados acima, onde o primeiro adquire a supremacia militar através deste acasalamento. Com os seres humanos, entretanto, o resultado é inevitável: os homens que desposam mulheres feéricas usufruem de poderes que ultrapassam o mundo social que de fato não lhes pertencem.
Quando não conseguem manter a seu lado a mulher do Outro Mundo, eles perdem as dádivas que receberam delas. É exatamente este padrão que subsiste na história de Eadric o Selvagem e na de Raimond de Rousset supra-citadas, bem como em Melusina. Cabe salientar que na maioria das lendas e sagas irlandesas, relatos de fundo indubitavelmente céltico, o mortal falha ao tentar manter a mulher feérica do seu lado. Pwyll parece ser uma exceção: ele consegue conservar Rhiannon, mas ele é um rei iniciado nas realidades do Outro Mundo.

A ambigüidade que envolve as entidades do Outro Mundo evidencia-se também na irredutibilidade de tais criaturas aos poderes constituídos pela hierarquia social. É o que pode ser comprovado na lenda do nascimento dos filhos de Macha, a qual integra o ciclo mitológico do Ulster. A Macha é uma divindade feminina citada em três relatos diferentes, e nesta tripla aparição ela parece evocar o esquema trifuncional dos indo-europeus22:
Um viúvo possuidor de terras, de nome Crunniuc, vê uma mulher entrar em sua casa e fazer todas as tarefas domésticas como se ela sempre tivesse estado lá. Ela põe a casa em ordem e à noite deita-se com ele, passando a viver na propriedade junto com seus filhos. Não muito depois, houve uma grande reunião dos Ulates, e Crunniuc resolve participar. Sua esposa lhe diz: 'Tome cuidado para não dizer tolices'. Ele vai até a assembléia e ao ouvir os elogios ao par de cavalos do rei não se contém e diz: 'Minha esposa é mais rápida do que eles'. O rei então manda detê-lo e envia mensageiros à mulher de Crunniuc para dizer-lhe que, se ela não fosse até a assembléia e corresse contra os cavalos do rei, Crunniuc seria morto. Macha vai até a reunião e solicita um adiamento, pois já estava sentido as dores do parto. O rei e seus homens não se comovem. Ela lhes diz que o mal que eles sofrerão será maior que o seu e os afligirá por longo tempo. Em seguida ela corre contra os cavalos e os vence, dando à luz um menino e uma menina ao final da prova. Mas os Ulates que ouviram os gritos do parto foram amaldiçoados por ela a sofrer suas mesmas as dores e a se tornarem tão fracos quanto as mulheres no leito durante cinco dias e quatro noites por nove gerações23.
Inicialmente cabe-nos observar que Macha é também uma encarnação da falecida mulher de Crunniuc, por isto age "como se sempre tivesse estado lá". Nos mitos celtas, "as gentes do Sid" são tanto divindades ou gênios de caráter local quanto os mortos em geral. Esta é só uma das versões da história, extraída do Livro de Leinster, de cerca de 1150. C. Lecouteux utilizou a versão de G. Dumézil em seu estudo sobre melusina para defender a existência de um proto-interdito que já existiria na história de Macha e, por um desenvolvimento unilinear, daria origem aos chamados interditos melusianos. Nesta versão, mais rica em detalhes, quando Crunniuc prepara-se para ir à assembléia, sua esposa lhe diz: "Não vá, para não correr o risco de falar de nós, pois nossa união só durará enquanto tu não falares de mim na assembléia"24. Para apoiar sua teoria, Lecouteux cita ainda a versão doLivro Amarelo de Lecan, onde a dama que adentra pela casa de Crunniuc não lhe conta seu nome alegando que, "se fosse obrigada a dizê-lo", ela deveria abandonar seu lar, e seu nome só é revelado quando ela amaldiçoa os Ulates25. Ocorre, porém, que a advertência de Macha não se prende à revelação de seu nome nem à menção de sua existência pura e simplesmente. A narrativa não teria sentido se assim fosse, porque, observe-se bem, em nenhuma das versões citadas Crunniuc pronuncia o nome de Macha, e na versão do Livro Amarelo de Lecan ele não poderia fazê-lo porque Macha não lhe conta seu nome. Na verdade, a advertência de Macha a Crunniuc é para que ele não revele aos outros o teor real de suas relações, por isto ele não deve "correr o risco de falar de nós", nem "dizer tolices" (isto é, falar demais). É precisamente o que Crunniuc acaba fazendo: ao dizer que Macha era capaz de correr mais rápido que os cavalos do rei, ele acaba por revelar sua condição de mulher do Outro Mundo. Só que o poderes destas mulheres feéricas não se acham submetidos à hierarquia vigente na sociedade celta. Elas só agem por intermédio de seus eleitos. Quando o rei e os demais membros da assembléia obrigam Macha a correr contra os cavalos, tentam controlar forças que estão fora do mundo social, daí serem amaldiçoados com uma transferência das dores do parto, imagem que evoca o papel de Macha como representante das forças procriadoras do Outro Mundo.

É a contradição fundamental destes seres do Outro Mundo em relação ao ordenamento usual do mundo humano que dá origem às diversas formas de interditos com que são cercados, concepção esta claramente explicitada emO galanteio feito a Etain. Este relato, que integra o ciclo mitológico da Irlanda, pode ser lido como o modelo inverso da história de Pwyll. Agora é Mider, um rei do "Sid", que vem à terra para levar Etain, sua antiga esposa no Outro Mundo.
Após muitas peripécias, Etain foi transformada num inseto pela primeira esposa de Mider e, sendo engolida por uma mulher mortal, ela nasceu deste lado do mundo, pois nos mitos celtas, os dois mundos estão numa relação invertida de complementaridade. É nesse ponto que a história nos interessa:
Étain, após ter crescido, foi prometida ao rei Ecchu Airem de Eriu. Mider vem cortejá-la, perguntando-lhe se ela não queria partir com ele para uma terra de prazeres e riquezas sem fim. Etain lhe diz que só partiria se ele a obtivesse de seu noivo. Mider então aparece um dia diante de Ecchu quando ele estava só e lhe propõe uma partida de 'fidchell' (jogo de tabuleiro semelhante ao xadrez). A aposta são cinqüenta cavalos de raça ornados com rédeas esmaltadas. Eles jogam e Mider perde. No dia seguinte ele encontra Ecchu no mesmo lugar e lhe dá os cinqüenta cavalos ornamentados. Mider propõe uma nova partida dizendo que se Ecchu vencesse ele lhe daria uma pequena fortuna em porcos, vacas, bezerros e carneiros, além de armas trabalhadas e mantos. O pai de criação de Ecchu, vendo-o com tantas riquezas, pergunta-lhe onde ele as tinha conseguido. Ecchu lhe conta o que ocorreu e seu pai lhe diz que é um homem de grande poder que veio até ele, e que ele deve impor-lhe tarefas difíceis. Quando Mider e Ecchu se encontram no dia seguinte, este propõe que Mider limpe um pântano, refloreste uma região e construa uma estrada na localidade. Mider protesta dizendo que Ecchu estava pedindo demais, mas aquiesce em realizar estes trabalhos sob uma condição: a de que nenhum homem comandado por Ecchu saísse de sua casa na noite seguinte. Ecchu concorda, mas manda seus intendentes ver o que estava acontecendo. Eles lhe contam que uma multidão inumerável surgida não se sabe de onde pôs-se a trabalhar sob as ordens de Mider, e em uma noite todas as tarefas foram realizadas. Entretanto, o calçamento da estrada não saiu perfeito porque o trabalho foi observado. Se ninguém tivesse assistido sua construção, aquela seria a melhor estrada do mundo. Já irritado com Ecchu, Mider propõe uma nova partida de 'fidchell' em que o vencedor escolheria o prêmio. Ecchu aceita, mas desta vez é Mider quem ganha, exigindo que Ecchu lhe deixasse pôr os braços em volta de Etain e beijá-la. Preso pela palavra, Ecchu consente, mas por precaução cerca sua residência com seus homens no dia em que Mider viria receber seu prêmio. Mider aparece na data combinada, põe seus braços em volta de Etain e leva-a na direção da clarabóia da casa. Lá, diante do espanto da corte de Ecchu, eles se transformam em dois cisnes e voam para o 'Sid' governado por Mider26.
O mesmo padrão de concepções presentes na lenda de Macha reproduz-se no exemplo supra-citado. A proibição que Mider impõe a Ecchu não se refere ao problema da visão das criaturas do Outro Mundo, senão ele próprio não poderia aparecer na corte de Ecchu. A intenção de Mider, de fato, é impedir que as criaturas do Outro Mundo sejam vistas em ação, isto é, utilizando-se de poderes que apenas elas detêm. Na concepção dos mitos celtas, ver equivale a avaliar, mensurar, contar, ou seja, adquirir alguma forma de conhecimento e controle de forças que estão além dos limites do mundo humano. Esta idéia acha-se claramente expressa no tema do encontro da rainha mítica Medb com os porcos da caverna de Cruachu. Na mitologia celta os porcos são freqüentemente associados ao Outro Mundo27, e a presença da caverna não deixa dúvidas de que estamos diante de uma das entradas do "Sid". Estes porcos saíam da caverna de Cruachu, mas se alguém tentava contá-los eles jamais permaneciam no local, de modo que ninguém sabia quantos eram. Uma vez Medb tentou contá-los, mas um deles pulou em seu carro e atrapalhou a contagem. Eles desapareceram em seguida e ninguém sabe para onde foram28. O interdito que cerca as entidades do Outro Mundo não proíbe especificamente que elas sejam vistas ou que seu nome seja revelado. Estas são as formas literárias que o interdito assume nos contos cortesãos da Idade Média. A proibição fundamental reside na impossibilidade de adequação destas criaturas aos ordenamentos culturalmente estabelecidos no plano da realidade humana, como o demonstra o próprio sentido da narrativa acima. Mider vem a este mundo exclusivamente para levar Etain. Ele deixa-se derrotar por Ecchu nas duas primeiras partidas de propósito, para compensá-lo pela perda de Etain (como detentor dos poderes mágicos do Outro Mundo, ele não poderia ser derrotado num jogo por um mortal). No entanto, irrita-se com Ecchu por este exigir demais, o que é uma forma de afirmar que os poderes e riquezas do Outro Mundo não estão sujeitos à autoridade dos reis e potentados deste mundo.

A partir dos dados obtidos pelo exame dos textos citados já é possível esboçar uma primeira conclusão a respeito das relações entre os mortais e as mulheres do Outro Mundo. Um dos objetivos do acasalamento de um ser humano com uma mulher feérica é justamente gerar descendentes que, pela própria condição de sua concepção, serão capazes de compatibilizar a força e a posição recebidas do lado paterno com a obtenção das graças do Outro Mundo providenciadas pelo lado materno. Observe-se que, por esta via, a incompatibilidade verificada entre as mulheres feéricas e os representantes das relações sociais institucionalizadas no interior da sociedade celta (como os nobres encarados como irmãos de criação de Pwyll, o rei dos Ulates na história de Macha e mesmo o pai de criação de Ecchu, que impele seu filho a aproveitar-se dos poderes de Mider) acha-se neutralizada, pois o filho da mulher-fada encontra-se inevitavelmente inserido nas relações de parentela e nos padrões de relações sociais vigentes na sociedade celta. É exatamente o que ocorreu com Pryderi, o filho de Pwyll e Rhiannon, segundo um modelo que encontra equivalentes em outros relatos de origem celta. Algumas vezes este padrão apresenta-se invertido, como no caso do grande rei Conare Mor, concebido da filha do rei Cormac com o homem pássaro Mess Búachalla, claramente um ser feérico29. Mas o significado destas uniões é sempre o mesmo: a composição entre os dois mundos através da geração de um descendente mortal que permanece ligado ao mundo feérico.

Este mesmo padrão repete-se em todos os relatos de Walter Map e Gervais de Tilbury: note-se que os cavaleiros que se casam com as fadas conseguem manter junto de si (isto é, deste lado do mundo) pelo menos um herdeiro, o que também se verifica no caso de Melusina e sua prole.
Há ainda algumas considerações a serem feitas sobre as formas de se representar estas mulheres feéricas nos mitos e sagas célticas. Mencionamos acima que Rhiannon é associada à forma eqüídea por derivação da deusa Epona. Esta mesma relação pode ser observada em Macha. Ela é equiparada aos cavalos contra os quais deve competir. Aliás, é justamente sua habilidade em superar os cavalos na corrida que revela sua natureza ambígua. Parece que a associação entre a mulher e os eqüídeos achava-se presente entre os celtas não apenas nos mitos. Giraud de Berri, outro dos clérigos agregados à corte de Henrique II, descreve - horrorizado - em sua Topographia Hiberniae um ritual praticado numa remota parte do Ulster, onde o rei é consagrado unindo-se carnalmente a uma égua branca que depois é sacrificada. Os pedaços do animal são fervidos e a água utilizada na preparação de um banho para o rei, sendo estes pedaços cozidos partilhados entre o rei e seus súditos30. Isto parece indicar que a relação entre as mulheres do Outro Mundo e os eqüídeos achava-se presente nas tribos celtas a partir de todo um complexo mítico-ritual. Corrobora esta hipótese o fato de que apenas as mulheres do Outro Mundo são associadas aos eqüídeos nos mitos e sagas celtas. Nos entes do Outro Mundo do sexo masculino, tal relação não se verifica.

É neste ponto que se observa o peso da cultura clerical sobre estes relatos de fundo céltico. O significado simbólico desta associação mulher-eqüídeo, demasiado elíptico mesmo nas tradições folclóricas medievais, acha-se substituído pela duplicidade da mulher-dragão ou serpente. O próprio papel de provedoras de bens e riquezas de origem não natural, essencialmente mágica, assumido por estas mulheres, impele-as para a ordem das entidades diabólicas, concepção que se vê reforçada através do simbolismo do dragão/serpente, criaturas inequivocamente demoníacas na tradição literária clerical. No entanto, as estruturas de significado cristalizadas nos substratos arcaicos raramente desaparecem de forma brusca. Podemos percebê-lo nos próprios exemplos citados acima. Na história de Gwestin Gwestiniog, a fada que se deixou apanhar por ele (pelo conteúdo da narrativa, é exatamente este o caso) serve-o voluntariamente até o dia em que ele lhe bate com o arreio. A referência ao arreio ajusta-se perfeitamente à dupla natureza mulher-eqüídeo observada nos casos de Rhiannon e Macha. Neste ângulo de análise, a questão do interdito na história de Eadric, o Selvagem também merece ser examinada. Eadric captura a fada pela força, mas depois esta declara que eles seriam felizes e prósperos desde que ele não reprovasse suas irmãs, as matas e o lugar de onde ela veio. Em outras palavras, Eadric não deve dirigir imprecações ao Outro Mundo, local onde se encontram forças que excedem os poderes humanos e não podem ser controladas pelos mortais. Na história de Hennon dos Grandes Dentes, por sua vez, onde a diabolização da fada apresenta-se completa através da imagem do dragão, não se verifica nenhuma espécie de interdito. A jovem que Hennon desposa simplesmente não assiste aos ofícios litúrgicos integralmente, o que levanta suspeitas sobre ela. Observe-se que neste caso há uma clara oposição entre os símbolos e referenciais litúrgicos (a celebração eucarística que a jovem não assiste, a água benta que a expulsa junto com sua serva, o padre que se encarrega de administrar-lhe a água benta etc.) e a característica ambígua da jovem e sua serva, revelada justamente através dos referenciais litúrgicos. Mas, por princípio, o modelo da mulher do Outro Mundo não se achava completo nesta historieta. Ele só vai se completar nos Otia Imperialia de Gervais de Tilbury, produzido décadas depois e receptivo à influência do escrito de Map. No relato de Gervais encontra-se não apenas a promessa de prosperidade da parte da fada como também a proibição que ela faz a seu marido de jamais vê-la no banho (o que revelaria sua dupla natureza, à semelhança dos referenciais litúrgicos da história de Hennon). Entretanto, a imagem do dragão/serpente ainda não se mostra definitivamente constituída. Segundo a narrativa, a fada tinha a forma de serpente somente na metade inferior do corpo, e ao ser surpreendida, ela mergulha na água do banho e desaparece; ela não sai voando impelindo grandes gritos sob a forma de um dragão, desfecho da história de Hennon que é retomado na lenda de Melusina de Jean de Arras.

O que queremos demonstrar com a análise destes relatos é que, no caso dos inter-relacionamentos entre a cultura folclórica e a cultura clerical na Idade Média a partir da produção literária e artística em geral do período, há toda uma estrutura de significados já consolidada que tende a permanecer enquanto unidades de sentido estratificadas em nível de mensagem. Ao mesmo tempo, o próprio processo de atualização do discurso cultural inerente à interação de referenciais culturais distintos tem como resultado a constituição de padrões interpretativos voltados à realidade social vivida pelos organizadores deste discurso. É esta dialética entre estruturas de significado já consolidadas a nível semiológico e padrões de significado que vão se consolidando a partir das condições sociais vigentes no momento da elaboração da mensagem que determina o teor e o conteúdo específicos de uma dada produção cultural.

Deste modo, o fundo céltico presente nas literaturas latina e cortesã dos séculos XII-XIII não pode ser inteiramente apreendido dentro da dicotomia sobrevivência mítica de tempos imemoriais/reflexo inevitável das condições de existência da sociedade medieval. Este é um ponto de capital importância para os estudos que se voltam à análise dos textos literários do período. É arriscado, por exemplo, atribuir a Marie de France uma concepção inovadora e supostamente subversiva do amor tomando por base o "lai de Milon", onde a heroína fica grávida do cavaleiro, seu amante. Não se pode ignorar que a autora está adaptando a uma platéia cortesã histórias de fundo céltico. E nestas histórias, normalmente o relacionamento entre um mortal e um ser feérico, independente do sexo do mortal, termina na geração de um descendente31. Não há nada de claramente inovador neste motivo, tanto mais que na época em que Marie escrevia, o ideal de "cortesia" não se achava ainda definido de forma ampla. Frente às condições impostas pelo embate entre a cultura clerical e a cultura folclórica, a metodologia que se afigura mais consistente parece ser a análise dos substratos arcaicos que permanecem nos textos medievais, o registro daqueles substratos que desapareceram por se revelarem inconciliáveis com o texto, e a explanação dos substratos arcaicos que permanecem no texto mas se apresentam modificados enquanto unidades de sentido.


NOTAS
1 KÖHLER, E. L'aventure chevaleresque. Paris, Gallimard, 1974.         [ Links ]Para uma visão dos seguidores de Köhler ver KELLOGG, J. L. "Economic and social tensions reflected in the romance of Chrétien de Troyes". InRomance Philology, vol. 39, 1985, pp. 01-21.         [ Links ]
2 LOOMIS, R. S. Arthurian tradition and Chrétien de Troyes. New York, Columbia University Press, 1949.         [ Links ]Toda uma linha de estudos semelhante à de Loomis mas voltada aos ciclos mitológicos celtas, foi realizada por autores como C.-J. Guyonvarc'h e F. Leroux, entre outros.
3 MAP, Gautier. Contes pour les gens de cour (Trad. do De Nugis Curialium por A. K. Bate), Belgique, Brepols Turnhout, 1993, pp. 145-146.         [ Links ]
4 Idem, pp. 148-150.
5 Idem, pp. 255-257.
6TILBURY, Gervais de. Le livre des merveilles (Trad. parcial dos Otia Imperialia por A. Duchesne), Paris, Les Belles Lettres, 1992, pp. 148-150.         [ Links ]
7 ARRAS, J. de. Mélusine. (Trad. em francês moderno por M. Perret), Paris, Stock, 1979.         [ Links ]
8 LECOUTEUX, C. Mélusine et le chevalier au lion. Paris, Payot, 1982, p. 24.         [ Links ]
9 MARKALE, J. Mélusine. Paris, Albin Michel, 1993, pp. 13-22.         [ Links ]Sobre Melusina, há ainda o estudo de CLIER-COLOMBANI, F. La fée Mélusine au Moyen Age. Images, mythes et symboles. Paris, Le Léopard d'Or, 1991. De todo modo, uma análise das estruturas de significado presentes em Melusina não foi realizada em profundidade.
10 ARRAS, J. op. cit., pp. 14-17.
11 LECOUTEUX, C. op. cit., pp. 184.
12 Idem, pp. 185-186.
13Sobre esta questão ver MELETINSKY, E. M. "Du mythe au folklore". In Diogène, t. 99, 1977, pp. 117-142,         [ Links ]ponto que está implícito ainda que num viés completamente distinto, nas teses de M. Eliade (ver ELIADE, M. Mito e realidade. São Paulo, Perspectiva, 1972).         [ Links ]
14 Episódio relatado em SJOESTEDT, M. L. Dieux et Héros des Celtes. Paris, PUF, 1940, p. 56;         [ Links ]e VRIES, J. de. La religion des Celtes. Paris, Payot, 1963, p. 238.
15 CIRLOT, V. (trad.). Mabinogion. Madrid, Siruela, 1988, pp. 10-26.         [ Links ]
16 Sobre o Outro Mundo céltico, ver CANA, P. Mac. Celtic Mythology. Hong Kong, Chancellor Press, 1983, pp. 122-131,         [ Links ]VRIES, J. De, op. cit., pp. 256-268 e ELLIS, P. B. A dictionary of Irish Mythology. London, Oxford University Press, 1987         [ Links ](verbete "Otherworld"). As ilhas distantes também eram um dos sítios de eleição do "Sid".
17 PUHVEL, J. Comparative Mythology. Baltimore and London, John Hopkins University Press, 1987, p. 174.         [ Links ]VRIES, J. De. op. cit., pp. 134-135.
18 Sobre o ciclo diurno dos povos celtas ver REES, A. e REES, B. Rees. Celtic Heritage. London, Thames and Hudson, 1961, pp. 83-94.         [ Links ]
19 STURLUSON, Snorri. Edda Meno. (Trad. de Luis Lerate). Madrid, Alianza, 1984, p. 41 e 62.         [ Links ]
20 GUBERNATIS, A. de. Mythologie zoologique ou les legendes animales. Paris, A. Durand et Pedone Lauriel, 1874, p. 307.         [ Links ]
21 Sobre a ideologia trifuncional dos indo-europeus e o "Mahabharata" ver DUMÉZIL, G. Mythe et epopée. L'idéologie des trois fonctions dans les epopées des peuples indo-européens. Paris, Gallimard, 1968.         [ Links ]
22 Sobre a Macha como divindade trifuncional ver DUMÉZIL, G. op. cit., pp. 602-612.
23 GANTZ, J. (trad.). Early Irish Myths and Sagas. London, Penguin, 1981, pp. 128-129.         [ Links ]
24 A transcrição completa desta versão acha-se em DUMÉZIL, G., op. cit., pp. 608-610.
25LECOUTEUX, C. op. cit., pp. 161-162.
26 GANTZ, J. (trad.). op. cit., pp. 52-57.
27 Pwyll recebe como presente do Outro Mundo os porcos de Annwfyn, que são mantidos com seu filho na quarta rama do "Mabinogi", voltado à história de Math, filho de Mathonwy (Mabinogionop. cit., p. 62). Na mesma história, o personagem principal, Gwydyon, encontra seu filho Lleu, que fora ferido e transformara-se numa águia (isto é, saíra da esfera da realidade humana) seguindo um porco que toma um caminho "como se fosse abaixo da terra" (Idem, p. 79). Já no conto "Kulhwch e Olwen" (Idem, pp. 99-141), o animal monstruoso associado ao Outro Mundo é o monstruoso javali Twrch Trwyth. Em bretão armoricano, "tourch" significa porco, e nas línguas celtas o javali é um porco selvagem, como ocorre com o inglês atual ("wild boar", javali, porco selvagem).
28 JACKSON, K. H. (trad.). A Celtic Miscellany. London, Penguin, 1971, pp. 159-160.         [ Links ]
29 Idem, pp. 159-160.
30 PUHVEL, J. op. cit., p. 237.
31J. Flori cita o "lai de Milon" em apoio à sua tese de que Marie de France adota uma postura "inovadora e subversiva" em relação ao ideal amoroso da época, o que nos parece exagerado ainda que tal "lai" não se refira a um ser feérico (FLORI, J. "Amour et societé aristocratique au XIIe. siècle. L'exemple des lais de Marie de France". In Moyen Age, t.XCVII, 1992, pp. 17-34).         [ Links ]












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